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Artur Lescher e o Barroco na Arte Brasileira Contemporânea


Casa Vogue_edição setembro_foto_Ruy Teixeira

RESUMO: Esse estudo analisa algumas obras do artista brasileiro Artur Lescher. A composição dessas obras parece ter origens antagônicas: por um lado, existem elementos cujas raízes poderiam ser escavadas no Renascimento e, por outro, há aspectos que remetem ao Barroco. Quando se toma distância de uma leitura mais comum acerca da arte de Lescher – que costuma ligá-la predominantemente à arquitetura modernista –, torna-se possível perceber uma faceta lúdica e infantil em suas obras. Nessa arte, a brincadeira deixa de ser um aspecto irrelevante e pueril para ganhar uma face subversiva. Ela navega na contracorrente de um espírito melancólico, próprio da modernidade e recupera a seriedade do brincar infantil. Esse lado irreverente e zombeteiro se vincula ao Barroco, mas ressurge em algumas obras de arte recentes, como as de Lescher.

PALAVRAS-CHAVE: Artur Lescher. Barroco. Melancolia. Brincadeira. Modernismo

Modernidade e luto

A modernidade é marcada por um extenso período de luto. Sucessivas mortes simbólicas abalam e ao mesmo tempo perfilam a era moderna. Uma delas é a hegemonia da Igreja Católica, que sofre forte impacto após a Reforma Protestante, liderada por Martin Lutero. A reação católica ao protestantismo também pode ser considerada como uma maneira de lidar com o luto. Não havendo meios de retroceder ao antigo modelo hegemônico, a saída parece ser negar a derrocada do regime eclesiástico. Trata-se de uma defesa contra a imponderabilidade de uma nova ordem e uma tentativa de reestabelecer os tradicionais lugares de poder. Visando resgatar a velha estrutura, a contrarreforma identifica no barroco sua principal arma para combater os ousados reformistas do sistema católico. O problema é que o estilo barroco convence pouco. A teatralidade histriônica de seu estilo excede o conteúdo a ser difundido. Ao exaltar a forma em detrimento do conteúdo, o barroco acaba por denunciar a fragilidade da verdade que procura defender. Os lapsos do discurso católico são acentuados pela arte barroca, que deveria precisamente encobri-los. O enredo inerente ao estilo não persuade nem mesmo seus atores, que recorrem à espetacularização. O maior exemplo disso está na peça de Shakespeare, Hamlet. Essa figura encarna a dúvida que impera sobre todas as coisas concernentes à tradição, retratando como nada é digno de confiança. Seu drama interno, testemunhado pela platéia, indica como as certezas deixaram de imperar e a assedia se alastra e impregna os ares da modernidade.

Não é por acaso, então, que Walter Benjamin (1928) traz o espírito melancólico para o centro dos dramas do barroco alemão, enfatizando esse ânimo como característico da modernidade. O declínio absoluto de quase todas as apostas modernas, calcadas antes na diversidade de dogmas e mais tarde nos valores iluministas, se dá apenas com o final da Primeira Grande Guerra. Pouco antes desta, assistimos ao nascimento da psicanálise em Viena. Ainda confiante na Lei paterna no interior da família burguesa, Freud elabora a psicanálise, destrinchando diversos conflitos inerentes à alma do homem moderno. Embora o pai da psicanálise não enuncie essa ideia expressamente, é notável como traços melancólicos perpassam as almas dos diferentes tipos de neuróticos do século XIX. A própria histeria das mulheres da era vitoriana revela um luto em relação às regalias da infância, perdidas de modo abrupto com a inserção delas na sociedade conservadora da Europa fin-de-siècle. Muitos sintomas obsessivos também são formas de defesa do sujeito contra inadmissíveis anseios agressivos e de morte dirigidos ao objeto, que se voltam para o próprio eu sob forma de melancolia.

Cada um desses apontamentos, porém, mereceria uma extensa dedicação e análises mais profundas. Mas nada disso será feito aqui. Deixarei esses temas abertos para discuti-los em outra ocasião e destacarei algo particular neste estudo. O que tenho em mente é a mudança que ocorre na contemporaneidade em contraste justamente com esse paradigma moderno, apresentado acima de maneira apenas panorâmica. Em outro artigo (PARENTE, 2012), já demonstrei como algumas obras de artistas contemporâneos têm na brincadeira um de seus motes. Esse espírito zombeteiro e brincalhão escancara a fragilidade dos valores, das leis e dos costumes, que deixaram de ser sólidos desde 1919. O abalo irrevogável da tradição não deixa margem para nada além de um grande e cínico entusiasmo com a brincadeira. A alternativa a ela seria o pânico ou o desespero diante do abismo de referências que circunda os sujeitos na atualidade. Frente à isso, depositar a seriedade no gesto de brincar não parece ser algo trivial. Depois que o mundo mostrou a face negra das sérias utopias, vertidas em terror totalitário, a brincadeira se tornou área que merece empenho e atenção. No presente artigo, Artur Lescher aparece como um artista que descobre na brincadeira, levada à sério, um modo jocoso de subverter a ordem vigente. Essa faceta lúdica encontra suas origens precisamente no barroco, como veremos à seguir.

Artur Lescher e suas travessuras barrocas

A dialética é um dos caldos que alimentam a obra de Artur Lescher. Para penetrar o movimento dialético próprio dessa obra é necessário, porém, certa delicadeza. Pelas leis da física, a colisão de objetos em movimento provoca uma troca de energia entre eles, capaz de transformá-los ou de alterar a direção original do percurso que seguiam. Isso quer dizer que do choque entre dois objetos resultam diversas modalidades de movimento ou deformações, que podem ou não ser revertidas.

Não é o caso, aqui, de explorar as leis da física extraídas dos diferentes tipos existentes de colisão. Trata-se antes de considerar a física da colisão como um léxico capaz de ser articulado com o idioma dessas obras. À maneira dos objetos que sofrem abalo, os trabalhos de Artur Lescher nascem de uma espécie de colisão que, no caso específico, ocorre entre elementos contrários. O embate entre dois componentes antagônicos é suspenso e congelado, formando uma condensação harmônica. Essa harmonia não significa ausência de tensão. As forças opostas não são extintas pelo choque. Elas se integram em uma unidade indissociável e dão forma à obra. A densidade desses pólos antinômicos unidos mantém vivo o atrito entre os elementos presentes no instante da colisão. Mas não basta reconhecer que as peças de Artur Lescher figuram um movimento antitético. Convém pensar, também, qual é a natureza dos componentes colididos em alguns de seus diferentes trabalhos.

Como bem notou Aracy Amaral (2002), as formas das obras de Lescher são precisas, límpidas, elegantes. Nelas, os ângulos retos predominam. Obedecem a uma espécie de racionalidade atrelada ao concretismo paulista e à arquitetura modernista de São Paulo. Possuem certa sofisticação que as distancia de um “entorno terceiro-mundista” (Amaral, 2002, p. 7), e as coloca ao lado de um cosmopolitismo refinado e culto (ibdem, p. 7). A beleza dessas peças está na extração do excesso para preservar o essencial de uma ideia, o que denota um viés matemático na composição dos trabalhos.

Economia, concisão, simplicidade e racionalidade das formas contrastam com magia, sonhos, ilusão, mitos, monumentalidade, artimanhas. Entretanto, as Elipses e outras obras como Pião (1993), Aqui e Mais Além (2006), Armadilha para Baby (2002) indicam precisamente esse outro rumo para se pensar a arte de Lescher. Logo, se por um lado Artur Lescher é herdeiro de um raciocínio que segue na esteira do Renascimento, no pólo oposto poderíamos colocá-lo escavando suas raízes no Barroco.

Não se trata de reconhecer em suas peças feições ou influências barrocas, o que seria um disparate. Ler o barroquismo nas obras de Lescher significa vislumbrar em suas formas uma camada menos aparente, ligada aos sonhos, jogos, enigmas, alegorias, labirintos. Não à toa Walter Benjamin (1928) pensou a modernidade pela chave do Barroco em dramas trágicos alemães – são as sombras da modernidade que podem ser reconhecidas pelos princípios do Barroco. Para Benjamin (1939), nas cidades modernas, além daquilo que se torna visível, racional ou abstrato, há labirintos, becos secretos, desvios, passagens que sussurram a língua das crianças ou dos poetas. Nesse sentido, não seria descabido pensar que, se as obras de Artur Lescher obedecem a uma linhagem racional, tendo como guia as palavras belas formas e justa medida, também há o avesso dessas ideias que operam pela brincadeira, pela irregularidade, pela fluidez, pelo exagero, pela violência.

Mesmo na análise feita por Aracy Amaral, na qual a faceta formal das obras de Artur Lescher prevalece, há uma passagem sugestiva a propósito de Armadilha para baby (2002), que conduz o raciocínio por outro caminho: “[Nas obras de Lescher] sempre [há] um princípio geométrico pensado como contraponto, antinomia ou complementaridade. Afinal, o quadrado contém o círculo ou o círculo pode conter o quadrado.” (AMARAL, 2002, p. 8). Embora o círculo possa estar implícito nos ângulos retos do quadrado, nas obras de Lescher as elipses são mais constantes, não só nas obras que levam este título, como nas curvas de Rio (2006/2008), Rio da Prata (2006) ou na instalação, Sem título (2006), de formato semelhante, exposta no Instituto Tomie Ohtake. Formas arredondadas e elípticas remetem ao livro Barroco, do quadrado à elipse de Sant’Anna, no qual os ideais que regem o Barroco são explorados. Para este autor (2000), a elipse é por excelência a forma do Barroco. Elas provocam deslocamentos. Por meio das formas elípticas, as figuras ganham movimento e o centro perde o seu eixo. Se nas imagens arquitetônicas as elipses são o excesso das formas, na retórica representam aquilo que não foi dito e que está ainda oculto. No discurso, as curvas das palavras e frases denotam faltas e ocultamentos.

Rio da Prata, 2006

Títulos como Raios (2007), Chuva (2008), Rio (2006-2008) remetem precisamente ao informe, ao descontrole, fenômenos da natureza dos quais somos reféns. A água, elemento instável, transitório, de fluxos e refluxos é substância ou referência recorrente nas obras de Lescher. Em vídeo-instalação de 1998, Lescher desenha as letras da palavra memória em uma superfície líquida e, quase no mesmo instante em que o vocábulo é escrito, ele se esvai nesse material fluído. Assim como o rio, na visão de Heráclito, que é sempre o mesmo, porém jamais igual, as lembranças são movediças e tem consistência análoga a da água – aderem ao corpo, mas são fugazes, escorregadias, quase inapreensíveis.


Rio, 2006/2008

A água pode sugerir calma, se pensada sob forma de Lagoas (2006), mas também possui a força das cascatas e a violência das tempestades, a capacidade de gerar energia, a imensidão de Rio máquina (2008). É figura central no “Inferno” da Divina Comédia de Dante Alighieri. Jorra das profundezas, escorre vigorosa nas curvas e nos caminhos sinuosos, inunda territórios. Esse fluxo contínuo a aproxima da música. Fisgar um único instante do tempo contínuo da água de um rio, da chuva ou de uma única nota musical de uma melodia, como na obra Sem título (1998) significa capturar um farelo do tempo, antes que o tempo da memória o apague por completo.

Rio máquina, 2008

Lagoas, 2006


Assim, a luminosidade, a perfeição e a precisão nessas obras não estão atreladas somente a traços racionais modernistas, mas também são formas de conceder consistência e solidez a algo tão difuso como o tempo e o movimento de cada coisa. Artur Lescher sobrepõe aos princípios do quadrado e da geometria, as irregularidades dos desvios, os descentramentos e tortuosidades do espaço ou de alguma substância. Se prima pela “acuidade excessiva na execução das peças” (AMARAL, 2000, p. 6), o faz de forma eloquente e persuasiva. Há algo de loquaz e grandioso em Lescher. O paradoxo entre a simplicidade elegante e o exagero monumental e prolixo faz parte dessa arte. Ao zelo minucioso e ao trabalho sério contrapõe-se uma faceta lúdica e engraçada.

A arquitetura na arte de Lescher também é uma arquitetura do deslocamento, quase de um trompe-l’oeil. Não sabemos ao certo se sua Elipse (2002) em madeira está mergulhando no plano desse mesmo material, ou se é uma extensão deste. Outras (2001) sugerem um movimento circular iminente e assustador, que, contudo, jamais passará de uma ameaça. A confusão também acontece diante de Teus olhos (2004-2009) de resina de poliéster e tinta automotiva, pois não sabemos se são os nossos olhos que as admiram ou se são elas a lançarem seu olhar enigmático para o espectador. Outras obras exigem ainda o próprio deslocamento do sujeito, que deve se posicionar no espaço inverso ao previsto habitualmente em alguns locais de exposição, como em sua obra Aerólito (1987) feita para a 19ª. Bienal de São Paulo, que flutuava em uma zona fora do eixo comum para a mostra, ou em Se movente (2002), que podia ser vista como um todo ao lado de fora do Museu de Arte Moderna de São Paulo.

Em Linha Roja (2005), linhas vermelhas destacam ângulos corriqueiros dos ambientes da galeria, invertendo a ordem de importância dos espaços arquitetônicos. Na obra Linha Vermelha (2008) essas faixas saltam das paredes e formam uma espécie de raio incidente que se refrata, sem que haja, contudo, qualquer espécie de superfície propícia à mudança de sua direção. Charneiras são colocadas nessas simples linhas de madeira, que ganham autonomia e assumem feições vivas em Metaméricos (2010). Enquanto Lygia Clark convidava o espectador a manipular seus Bichos (1961), dobrando-os e desdobrando-os, os gonzos de Lescher concedem leveza e movimento às madeiras, que se tornam articuláveis e exigem do observador o resgate de certo imaginário animista, próprio das crianças.

No texto Poeta criativo e seus devaneios, Freud (1909) lembra que na infância a brincadeira é ocupação predileta. Nela a criança cria um mundo próprio. Facilmente superado por ela, o paradoxo existente entre as palavras seriedade e brincadeira, geralmente vistas como tendo significados antagônicos, é um bom caminho para se compreender o desafio enfrentado por alguns artistas. Jogos e brincadeiras são realidade para a criança e, nesse sentido, são “coisas que devem ser levadas a sério”. Superar frequentemente a antinomia entre o lúdico e a seriedade, dando a ver a verdade contida no brincar é o apelo feito pelas obras de Artur Lescher. Dois volumes dedicados ao caráter lúdico do barroco, mostram a relevância de tal aspecto para esse estilo de arte. “O artista do Seiscentos [...]” lembra Ávila (1994):

sente, de modo mais intenso que o renascentista, a paixão da aventura humana, porém é compelido a contê-la, a disfarçá-la, a dissimular os seus apelos e suas vertigens, sublimando-os através de uma criação em cujo processo o jogo das formas desempenha função preponderante (ÁVILA, p. 72).

Segundo esse autor, as soluções lúdicas do Barroco são simultaneamente sutis e profundas, sem qualquer semelhança com o “carpe diem hedonístico de Horácio, o sugar até à medula o osso da experiência existencial, o fruir até a exaustão aquilo tudo que piace al mondo e è breve sogno do veros petrarquiano” (ÁVILA, p. 72). Trata-se antes, na visão de Ávila, de agarrar o esvair do sem sentido do tempo, apreender um espaço agônico entre a materialidade passageira das coisas e a transcendente perenidade do espírito. Tal espaço é redimensionado “nas seis faces do dado, cujo lance é sempre o jogo consciente da forma, da cor, da palavra, da ideia, do ritmo, da melodia” (ÁVILA, p. 73). O jogo na arte barroca não significa, contudo, tornar-se simplesmente alheio aos acontecimentos que cercam o artista. Jogar implica certa rebeldia e liberdade próprias da infância, que incidem sobre a tradição e agem contra aquilo que constrange e sufoca na realidade material 1.

Pião (1993) apresenta esse brinquedo simples de crianças, rodopiando eternamente. Prestes a esparramar seus poderes se o frágil movimento oscilar, a obra aparentemente inocente concentra aspectos potentes. O pião sustenta o mercúrio, líquido denso e perigoso, que, como espelho, reflete a imagem daquele que o olha. Na mitologia grega o deus Mercúrio (Hermes), é deus da astúcia, da velocidade, da sagacidade. Filho de Zeus, é precoce e arguto, conseguindo, ainda criança, ludibriar até mesmo o deus Apolo, ao roubar o rebanho que estava sob seus cuidados. Sua habilidade e rapidez conduzem tanto para as trevas, como para a luz.

A base de ferro desta obra, por outro lado, remete a Hefesto, deus coxo e genial com uma profunda e incomparável ideia da beleza. Muitas vezes associado ao fogo, que vence a água, Hefesto é reconhecido por seus nobres trabalhos e pela engenhosa habilidade. Ao contrário de Hermes que era afeito a traquinagens, foi rejeitado pelos pais (Hera e Zeus), tendo que amadurecer precocemente.

No interior desta ótica não é difícil reconhecer nas obras de Artur Lescher um arteiro, que, como o deus mensageiro, aprendeu a fazer arte, mas como Hefesto, o faz com acuidade e sabedoria. Em Pião (1993) esta dualidade se torna nítida, mas não é a única obra a possibilitar leitura nesse sentido.

Artur Lescher não abdica da brincadeira, faz mais: a exalta. Ela merece fôlego, trabalho, solidez e requinte. A faceirice de criança se consolida e inofensivos castelos de areia ganham uma forma contundente até perfurarem valores estabelecidos e compartilhados socialmente. Se o brincar da criança é determinado por seu desejo de ser grande e adulto, o adulto quer brincar, mas sabe que esperam dele que atue no mundo real. Verter sonho em realidade é trabalho do artista, como podemos ver em cada uma das obras aqui analisadas.

Metapsicologia da fluidez

Nas mãos desse artista brasileiro, natureza e cultura são duas faces da mesma moeda e nenhuma delas se rende à força da outra. A ferocidade da água que num torvelinho tudo devasta é a mesma daquela encontrada em Pião, obra que sustenta de forma frágil o venenoso mercúrio, prestes a ser lançado. Tão orgânica quanto a natureza, a arte é capaz de apreender pequenos fragmentos do tempo, que frequentemente se esvaem, bem como da matéria, em constante mutação. Nessas capturas, Lescher concede novo estatuto às brincadeiras, às armadilhas elaboradas pelas crianças para ludibriar os adultos, aos experimentos infantis com seres vivos – como os tatus-bola ou minhocas. Se o adulto envergonha-se de suas fantasias por serem infantis e proibidas, Artur Lescher devolve a elas seu devido espaço e seriedade no mundo adulto. Isso poderia parecer pouco ou trivial, mas há precisamente neste gesto algo de subversivo: a brincadeira não se resigna às exigências do mundo estabelecido e o questiona com irreverência. Diferentemente da entrega melancólica ao eterno luto, há certo sarcasmo perante a inexorável finitude da existência. Na arte de Lescher, a brincadeira não se rende aos implacáveis ditames do tempo, aprisionando instantes preciosos em obras de profunda beleza.

Referências

AMARAL, A. A tática da elegância: entre o espacial e o serial. In: Artur Lescher. Cosac & Naify, 2002.

ÁVILA, A. O lúdico e as projeções do mundo barroco. São Paulo: Editora Perspectiva, 1994.

BENJAMIN, W. (1939) “Charles Baudelaire, um lírico no auge do capitalismo”. In: Obras Escolhidas III. São Paulo: Brasiliense, 1989.

BENJAMIN, W. (1928) Origem do drama trágico alemão. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2011.

FREUD, S. (1908) “Escritores criativos e devaneio”. In: Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud (v. IX). Rio de Janeiro: Imago, 1996.

PARENTE, A. A. M. O que vem de dentro me atinge. In: Revista Percurso de Psicanálise, no. 48, ano XXIV: Jun/2012.

ARTUR LESCHER AND BAROQUE IN BRAZILIAN CONTEMPORY ART

ABSTRACT:

The study analyzes some works of Brazilian artist Artur Lescher. The composition of his works seems to stem from antagonistic sources: on the one hand, some elements are rooted in the Renaissance period and, on the other, certain aspects denote the Baroque. When you step back from a more widespread interpretation of Lescher’s art – which connects it predominantly to modernist architecture – a ludic, playful quality may be noticed. Nevertheless, in this art play relinquishes its puerile, irrelevant aspect to gain a subversive one. It surfs on the contraflow of the emblematic melancholic spirit that characterizes modernity to recover the seriousness of child play. This resulting irreverent artistic aspect is associated with the Baroque, but it also appears in recent works of art, such as Lescher’s.

KEYWORDS: Artur Lescher. Baroque. Melancholia. Child play. Modernism.

ARTUR LESCHER ET LE BAROQUE DANS L’ART CONTEMPORAIN BRÉSILIEN

RÉSUMÉ:

Cette étude analyse quelques œuvres de l'artiste brésilien Artur Lescher. La composition de ses travaux semble avoir des sources antagonistes: d'une part, il y a des éléments dont les racines pourraient être creusés sur la Renaissance et, d'autre part, il y a des aspects qui font référence au baroque. Lorsque vous vous éloignez de l’interprétation plus connue de l'art de Lescher – connectée principalement à l'architecture moderniste –, il devient possible de constater une facette ludique et enfantine dans ses œuvres. Dans son art, le jeu cesse d'être sans importance, et l’enfantin gagne une aspect subversive. Elle surfe contre l’esprit mélancolique de la modernité et récupère la gravité qui caractérise le jeu chez l’enfant. Ce côté moqueur et irrévérencieux est lié à la musique baroque, mais il réapparaît aussi dans certaines œuvres d'art récents, comme chez Lescher.

MOTS-CLES: Artur Lescher. Baroque. Mélancolie. Joke. Modernisme.


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